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e cobertura de déficits em transações correntes atendida por uma
instituição pública multilateral.
Em sua concepção original, o FMI deveria funcionar como um
provedor de liquidez aos países com desequilíbrio de curto prazo no
balanço de pagamentos. O artigo VII de seus estatutos, a chamada
cláusula da “moeda escassa”, previa a adoção de controles cambiais
em situações de agudo desequilíbrio do balanço de pagamentos.
Câmbio e juros, nesse sistema, eram preços-âncora, cujas relati-
vas estabilidade e previsibilidade eram vistas como essenciais para
a formação das expectativas dos possuidores de riqueza envolvidos
nas decisões de produção e investimento.
Esse “modo de regulação” tinha um duplo objetivo: construir
um sistema monetário realmente internacional, favorável à expan-
são do comércio entre as nações, e impedir que condicionantes ou
choques externos passassem a comandar a política econômica do-
méstica e a definir a trajetória das economias nacionais.
A experiência das globalizações financeiras demonstra que
os humores dos mercados financeiros globalizados impõem suas
razões às políticas monetária e fiscal dos países de moeda incon-
versível que abrem suas contas de capital, surfam nos ciclos de cré-
dito externo, permitem a valorização cambial e se tornam devedo-
res em moeda estrangeira.
O plano apresentado por Keynes em Bretton Woods não só cui-
dava de contornar o inconveniente de submeter o dinheiro univer-
sal às políticas econômicas do país emissor, mas, sobretudo, estava
concebido para impedir que a moeda internacional assumisse a
função reserva de valor, forma final da riqueza, perigoso agente da
“fuga para a liquidez”.
No plano Keynes não haveria lugar para a livre movimentação
de capitais em busca de arbitragem ou de ganhos especulativos. Em
1944, em Bretton Woods, a utopia monetária de Keynes capitulou
diante da afirmação da hegemonia americana que impôs o dólar
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