Page 222 - Quarentena_1ed_2020
P. 222
subnutrição, habitando em casas sem saneamento adequado, por
ausência de esgoto, abastecimento de água ou coleta de lixo.
Nada disso é decorrência de um destino inexorável.
É resultado de uma soma de opções políticas com as quais
concordamos ou sobre as quais silenciamos.
Mas há o que fazer.
Por exemplo, há muito se sabe, que há produção suficiente de
alimento; que há terras em abundância para todos; e que com a
redução da jornada de trabalho, sem diminuição de salário, haverá
trabalho remunerado para todas as pessoas.
Por isso, é tão revoltante pensar na “solidariedade” que move
campanhas publicitárias pela prevenção da COVID-19 capitanea-
da por quem há décadas vem agindo para que essas situações não
apenas se perpetuem, mas se constituam e se agravem.
Lamento, pois, não compartilhar o entusiasmo de quem con-
fronta as declarações genocidas de alguns grandes empresários,
com o discurso humanitário de outros. Todos eles (todos nós) con-
corremos para chegar até aqui. Isso não os coloca em pé de igual-
dade nem anula os efeitos positivos de movimentos solidários e res-
ponsáveis, que de algum modo contribuam para o enfrentamento
da pandemia.
É só tardio, insuficiente e hipócrita.
Talvez não seja a melhor hora para dizer disso, mas é necessário.
Se não agora, quando perceberemos que escolhemos, como so-
ciedade, um caminho totalmente equivocado, que implicou o des-
carte de milhões de pessoas e que, como neste instante é possível
ver, abala a vida de todas as pessoas?
O mínimo que se deve fazer para reparar os erros cometidos é
utilizar, emergencial e urgentemente, o capital acumulado nas mãos
de poucos e dos governos na proteção dos excluídos históricos, para
evitar que sejam as maiores vítimas de um mal que não criaram.
222