Page 188 - Quarentena_1ed_2020
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riqueza privatizada a todo custo, respaldada na ilimitada explo-
ração e espoliação do trabalho, na corrosão completa dos direitos
sociais, na destruição da natureza, no racismo, no sexismo, na ho-
mofobia, na xenofobia, tudo isso sob o embalo da mais horripilante
forma de poder da modernidade, que é a aberração fascista.
Agora, entretanto, o rei está nu: a essência perversa e destrutiva
do sistema de metabolismo antissocial do capital destrói o trabalho
e a humanidade, destrói a natureza, explora e oprime intensamente
as mulheres, os negros e as negras, os/as indígenas, impede a busca
vital da igualdade substantiva, a felicidade da juventude, a plena
liberação sexual, etc. É chegada a hora de obstar, barrar, travar e
impedir mais devastação, mais sujeição, mais desumanização.
Como disse recentemente em entrevista ao Marco Zero
Conteúdo: até poucos meses atrás, toda a grande imprensa citava o
Chile como exemplo mais “maravilhoso” e bem sucedido do neo-
liberalismo na América Latina. E esse projeto entrou em colapso
com a explosão de uma enorme rebelião popular. E o que causou
esse levante? Foi o aumento da passagem do metrô, ocasião em que
o “copo transbordou”, depois de uma sucessão quase interminável
de saques e vilipêndios.
Chega uma hora, então, que as saídas são muito imprevisíveis,
que dão sentido à metáfora do Bacurau . Isto porque é difícil ima-
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ginar que uma sociedade – qualquer que seja ela - possa ser destro-
çada ilimitada e eternamente.
E termino com outra metáfora: o grande escritor latinoamericano
Ciro Alegria escreveu um belíssimo livro sobre a América indígena,
cujo título é Grande e Estranho é o Mundo. Pois é nesse imenso e es-
tranho universo que aflora o dilema crucial de nosso tempo: ele não
pode ser outro senão o de reinventar um novo modo de vida.
98 Bacurau é o excelente filme brasileiro dirigido por Kleber Mendonça Filho e
Juliano Dornelles.
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