Page 222 - Garantia do Direito à Educação
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Jane Paiva


                    outras, em sociedade, e por meio das quais aprendem, pelo forte traço
                    educativo dessas relações. Essa marca coletiva valoriza não apenas sabe-
                    res considerados de prestígio, mas (re)conhece todos os saberes de expe-
                    riência feitos, como resultantes de processos culturais que a humanidade
                    vem vivendo ao longo da sua história. Processos que não são únicos, mas
                    vários, limitados e delimitados pelas maiores ou menores possibilidades
                    em que inserções de classe, inserções de pessoas no modo de produção,
                    pelo trabalho, constituem o seu “estar no mundo”. Mas processo sempre
                    novo, sempre outro, porque admitindo a inventividade da criação hu-
                    mana como incontrolável, capaz de rupturas e de perplexidades, onde
                    quer que se faça uma possibilidade de intervenção na realidade.
                         Esse currículo não tem de ser inventado. Ele existe, com maior
                    ou menor grau de visibilidade nas escolas. Está lá, é praticado cotidia-
                    namente por professores e estudantes, com frequência não é assumido
                    como currículo, mas entendido como extracurricular, ou cocurricular. 8
                         Quais serão então, segundo esse modo de encarar currículo, os “con-
                    teúdos” de um currículo integrado à educação profissional, na escola de
                    EJA? O que sabem jovens e adultos? O que sabem sobre o mundo do
                    trabalho e do ser trabalhador? Que outros saberes portam e devem ser re-
                    conhecidos e confrontados com perspectiva de ampliação? Como fazê-lo?
                    Onde estão esses saberes, como se entrelaçam aos “conteúdos” da escola,
                    e como, ao fazê-lo, tecem redes de conhecimento que só efetivamente
                    ganham sentido quando conseguem conectar-se, por fios e nós, a conhe-
                    cimentos significativos produzidos pela experiência, nas práticas sociais?
                         O sujeito humano, ser de relações que interage com elementos da
                    natureza e com o mundo da cultura, com outros homens e mulheres e
                    consigo mesmo, ao mesmo tempo interage em outro plano, aquele das
                    relações simbólicas, quando cria representações que o orientam e o si-
                    tuam no mundo. Nestas relações simbólicas, apropria-se de costumes,
                    valores e hábitos estabelecidos pelo grupo social do qual faz parte. Esta



                    8  Esta concepção vai na contramão do que foi aprovado na BNCC, que considera um currículo único como
                    capaz de dar conta das múltiplas realidades, a fim de garantir êxito na escola pública, desconsiderando
                    os múltiplos currículos em ação existentes nas escolas brasileiras, segundo características das populações.


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