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O progressismo é um liberalismo pragmático e realista porque,
            ao contrário da ingenuidade liberal, que crê na possibilidade do
            funcionamento dos mercados com o estado mínimo, reduzido a
            guardião das leis e da moeda, os keynesianos sabem que a disputa
            capitalista é entre indivíduos e empresas, mas também entre nações
            e blocos de nações, extrapolando para a geopolítica mundial. Por
            isso, o estado deve entrar ativamente na disputa capitalista e garan-
            tir que as empresas nacionais ou instaladas em seu território sejam
            competitivas, por meio de investimentos massivos em infraestru-
            tura, educação, ciência e tecnologia, políticas industriais, controles
            de capitais, do câmbio, dos juros e até mesmo assumindo empresas
            em setores estratégicos.
               Por conta desse pragmatismo, os keynesianos são mais
            capitalistas que os liberais, cuja política de retirada do estado acaba
            por enfraquecer o país na competição internacional, levando-o
            à pobreza. Todos os estados industriais ricos e competitivos da
            atualidade foram e ainda são, em larga medida, keynesianos, da
            perspectiva da interferência efetiva do estado na economia nacional
            com a finalidade de posicionar o país como vitorioso na ferrenha
            concorrência mundial. É o caso dos EUA, Alemanha, Japão, China
            e Coreia do Sul: nenhum deles cometeram o suicídio de praticarem
            um liberalismo puro sangue, de estado mínimo.
               O advento do neoliberalismo, portanto, não foi uma vitória
            completa das ideias do liberalismo financeiro sobre o progressis-
            mo e a economia real. Foi, antes, uma acomodação entre ambos,
            corroendo as receitas distributivas e de proteção social, de matriz
            keynesiana, no interior dos países, mas mantendo a participação
            ativa do estado na guerra de capitalista. O neoliberalismo dos
            países vencedores é uma espécie de keynesianismo selvagem, que
            apoia ativamente o capital financeiro e produtivo, proporciona em-
            prego e crescimento do PIB, mas paga mal o trabalho e lhe oferece
            pouca proteção social. O modelo mais vitorioso desse “novo keyne-
            sianismo” é a China, mas ele se instala paulatinamente nas demais



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