Page 60 - Ação integrada de formação de professores
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reter o que foi dito. Nada “gruda” no aluno a não ser aquilo que ele é capaz de tomar como
uma percepção adequada da vida e do mundo.
É por isso que nos orientamos, aqui, pelo entendimento de que é primordial, no que
se refere à educação e à formação docente, o professor constituir-se como sujeito inserido
na cultura, como quem tem intimidade e cumplicidade com ela e, porque não dizer, uma
relação positiva com a tradição cultural. Cumplicidade esta que Hannah Arendt considera
imprescindível ao afirmar que “qualquer pessoa que se recuse a assumir a responsabilidade
coletiva pelo mundo não deveria ter crianças, e é preciso proibi-la de tomar parte em sua
educação” (ARENDT, 2002, p. 239).
Somente dessa forma, como uma espécie de testemunho vivo, o professor conseguirá
atestar a importância da aprendizagem dos saberes curriculares por parte dos alunos. Nesse
sentido, ele deve superar o que seria uma apresentação neutra ou desinteressada de sua
matéria, como se ela fosse algo alheio a sua vida. Assim, pode-se dizer que o currículo, como
dimensão da cultura mediada pela docência, deve ser expressão das percepções vivas que a
geração presente se propõe a testemunhar diante daquela que está chegando.
O entendimento da docência como testemunho vivo da cultura a ser tematizada através
dos currículos escolares sugere que a primeira coisa a ser considerada na preparação de uma
aula seja, de fato, a verificação do grau de intimidade do professor com o conhecimento que
pretende trabalhar com os alunos. Trata-se de uma espécie de exame de consciência prévio
em que o professor se pergunta acerca dos motivos que encontra em sua própria experiência
para atestar a validade ou a importância do conteúdo a ser ministrado. Assim, o aspecto
propriamente constitutivo da docência está em ter aprendido antes, em ter assumido como
percepção sua o que, como professor, propõe-se a ensinar.
Sabe-se que todo conteúdo cultural que consta no currículo escolar engendrou-se
historicamente através de algum processo discursivo, que, por sua vez, resultou na sua
validação. Diante disso, espera-se que o aprendizado anterior do professor tenha sido uma
espécie de “recapitulação” desse processo, incluindo aí a identificação da problemática humana
ou social desencadeadora desse discurso. Tendo aprendido dessa forma o que consta como
conceito, teoria, técnica ou valor a ser ensinado, o professor terá a noção exata e, possivelmente,
crítica dos limites e alcances daquilo que propõe como dimensão da cultura a ser aprendida
pelos seus alunos.
À constituição da docência segue-se o exercício dela propriamente dito, ou seja, o
momento da interação pedagógica com os alunos. Nesse momento, o desafio maior do
professor é conseguir a cumplicidade do aluno no seu processo de aprendizagem, uma vez
que a aprendizagem não é algo que alguém possa fazer pelos outros. É impossível produzi-la
de “fora para dentro”, ao modo de uma ação instrumental. Aprender e, consequentemente,
ter um conhecimento significa vir a ter uma nova percepção, o que só é possível ocorrer em
perspectiva própria, de modo sempre original, único e irrepetível.
A aprendizagem da tradição cultural ou a construção do conhecimento referente a
ela implica “o empenho dos atores considerando os seus motivos, isto é, os seus desejos e os
significados que atribuem à sua própria atividade de aprendizagem” (TARDIF, 2002, p. 137).
Assim, pode-se dizer que, no processo educativo, a aprendizagem aparece como resultado
de uma instigação, de um envolvimento, de uma inquietação que o professor seja capaz de
provocar nos alunos. Afinal, o aluno se instiga a aprender quando vê “o brilho nos olhos” do
professor, quando percebe nele a diferença que faz ter um conhecimento como o que lhe é
AÇÃO INTEGRADA DE SUMÁRIO 59
FORMAÇÃO DE PROFESSORES