Page 68 - Ação integrada de formação de professores
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a mais tenra idade, a criar bases e rotinas de leitura, de cálculo, de pensamento, cruciais para
outras aprendizagens.
O professor precisa conhecer o mundo para ensiná-lo. O que supõe, na perspectiva de
Arendt (1972), que o professor não pode estar somente a um passo do aluno, em termos de
conhecimentos. Sua responsabilidade e sua autoridade se baseiam, principalmente, na sua
capacidade de posicionar-se como representante dos adultos, indicando detalhes sobre o
mundo, que permitam que a criança se situe neste mundo e possa compreendê-lo.
A relação que o educador estabelece com o educando é assimétrica, no sentido de que
o professor tem qualificação e um saber que lhe investem autoridade e responsabilidade
diante dos educandos. Estes, por seu turno, buscam, partindo do que já sabem, progredir em
termos de conhecimentos reconstruídos, que lhes possibilitem posicionar-se melhor diante dos
diferentes temas que lhes são apresentados no dia a dia. Trata-se, então, do estabelecimento de
diálogo, num esforço de conversação, a fim de construir novos entendimentos.
A função do educador sustenta-se no conhecimento que possui, na sua abertura ao outro,
na sua disposição para dialogar e acolher o aluno, na valorização do que ele traz em termos de
bagagem cultural, propiciando que os educandos compartilhem o que já sabem e, a partir do
que já sabem, ampliem e aprofundem seus conhecimentos.
Nessa relação, o professor também aprende, pois ressignifica seus conhecimentos acerca
do processo de ensino e aprendizagem, sempre em busca de novas metodologias e estratégias
facilitadoras da aprendizagem, de entendimentos mais alargados sobre a diversidade que
caracteriza os educandos e as suas diferentes formas de portar-se diante dos objetos de saber.
Ou seja, o educador precisa dominar seus conteúdos de ensino e aprender no exercício da
profissão a ouvir mais, a aprofundar suas visões e possibilidades de acompanhar os estudantes
e auxiliá-los a ir além.
Nas palavras de Hannah Arendt:
Embora certa qualificação seja indispensável para a autoridade, a qualificação, por maior
que seja, nunca engendra por si só autoridade. A qualificação do professor consiste em
conhecer o mundo e ser capaz de instruir os outros acerca deste, porém, sua autoridade
se assenta na responsabilidade que ele assume por este mundo. Em face da criança,
é como se ele fosse um representante de todos os habitantes adultos, apontando os
detalhes e dizendo à criança: - Isso é o nosso mundo (ARENDT, 1972, p. 239).
Dessa maneira, assim como os pais têm a missão de dizer à criança como este mundo é,
introduzindo-a no mundo da cultura, o educador deve ser capaz de trabalhar competentemente
com os conteúdos, utilizando metodologias adequadas, e, principalmente, assumindo a
responsabilidade perante a criança de possibilitar que ela se aproprie da tradição, sabendo do
mundo, percebendo-se como parte desse mundo.
Por isso, quando nos perguntamos se o professor tem supremacia em relação ao aluno,
essa questão nos remete novamente ao instituído e ao instituinte na escola, pois, em relação
ao instituído, o educador tem, sim, um lugar constituído, em função de seus saberes e de sua
formação. No entanto, na relação, no movimento instituinte, esses lugares são relativizados e o
educador deverá exercer a docência, sem nunca utilizar o poder para emudecer ou para fazer
calar. O professor precisa despertar o desejo pelo conhecimento. Não se trata de uma relação
de dominação ou de doutrinação, mas, sim, de uma relação dialógica, de interação mediada
pelo saber e pela busca de significados.
AÇÃO INTEGRADA DE SUMÁRIO 67
FORMAÇÃO DE PROFESSORES